domingo, 23 de outubro de 2011

Mutação e Reparo - rascunho de aula para GenMol

Este texto contém apenas apontamentos de aula, retirados em parte de sites da internet e comentados pelos professores e pelos monitores. Não dispensa a leitura do assunto nos livros de referência


Introdução


Mutação é qualquer alteração herdável e permanente na sequência do DNA genômico, que não pode ser explicada por processos de recombinação e que pode (mas não necessariamente vai) resultar em perda ou ganho de funções pela célula. A mutação é a principal fonte de toda a variação genética (há várias outras, que não serão objeto desta aula), e consequentemente, o motor da evolução. 


A mutação é um processo necessário para fazer com que um organismo possa se adaptar a novos ambientes. Mas é necessário haver um equilíbrio entre mutação e reparo para que haja vida e biodiversidade. A incidência elevada de mutações pode ser interessante para organismos cuja estratégia é a reprodução/replicação rápida, como vírus. Um reparo eficiente elimina muitas das mutações que naturalmente ocorrem e reduz a variação genética da progênie, mas aumenta a chance de sobrevida num ambiente não modificado em relação àquele normalmente encontrado pelo organismo. Por isso, cada organismo tem uma taxa de reparo diferente. 


Dentro do próprio genoma os trechos de DNA podem ser diferencialmente reparados. Os "hotspots" de mutação são os trechos que sofrem menos reparo, já que, em princípio, as mutações ocorrem aleatoriamente ao longo de todo o genoma.


As mutações podem ocorrer nas células da linhagem germinativa como também nas células da linhagem somática.  As mutações que ocorre na linhagem germinativa podem ser passadas a seus descendentes.


A célula tem vários mecanismos que vasculham o genoma em busca de erros de síntese de DNA (mutações que são o resultado da própria replicação) e lesões do DNA (mutações por agentes químicos e físicos, por instabilidade intrínseca das moléculas e ainda por outros processos celulares). Assim, podemos dizer que esses erros geralmente ocorrem devido a falha na replicação do DNA antes da divisão celular, quando o DNA é duplicado (tautomerismo, figura 1); lesões químicas ou físicas no material genético; inserções geradas por elementos móveis de DNA (transposons, DNA exógenos,...); e erros relacionados a individualização dos cromossomos (ex.: crossing-over, separação das cromátides ou dos cromossomos).


Figura 1. Tautomeria: as 4 bases nitrogenadas permutam entre si sua característica química, tendo cada forma estável sua contrapartida instável. Na hora da síntese a DNA polimerase pode erroneamente incorporar uma base pela outra quando ela se encontra na forma tautomérica. Isso é válido tanto para a base da fita molde como para o precursor.

Como conseqüência, as mutações podem causar alterações permanentes no DNA, seja em sequência codificante de um gene ou em sua sequência regulatória, ou ainda em regiões intergênicas, podendo interferir na função da proteína gerada ou totalmente inativá-la. Outra conseqüência é que algumas alterações químicas ou físicas no DNA impedem sua utilização como molde para replicar e transcrever.


O mecanismo de reparo deve ser rápido e eficiente, para evitar que uma mutação possa ser passada para os descendentes; ele também precisa identificar qual fita contém a mutação, distinguindo entre a fita parental (velha) e a fita filha (nova, recém duplicada), tendo esta última presumivelmente a lesão.

            As lesões podem ser espontâneas ou induzidas, e assim também sção classificadas as mutações (isto é, aquelas lesões que não puderam ser reparadas e passaram a integrar o genoma das células filhas). As mutações espontâneas podem ser classificadas como mutações de ponto (transversões, transições ou mudança na matriz de leitura) e as induzidas são geradas por fatores ambientais, como radiações ionizantes e não ionizantes e agentes químicos (mutagênicos).


Transposições
Quando uma purina é trocada por outra purina ou  uma pirimidina por outra pirimidina.


Transversões
Quando há troca de uma purina para uma pirimidina e vice e versa.
(Figura 2)


Figura 2. Transições e transversões.

As mutações são classificadas em geral como gênicas e (aberrações) cromossômicas (Figura 3). As mutações gênicas são mudanças repentinas que ocorrem nos genes, ou seja, são o processo pelo qual um gene sofre uma mudança estrutural. As mutações distinguem-se das aberrações por serem alterações a nível de ponto, envolvendo a eliminação ou substituição de um ou poucos nucleotídeos da fita de DNA. As mutações cromossômicas ocorrem ao nível dos cromossomas, envolvendo alteração de grandes quantidades de genoma por exemplo em cromossomas ou até grupos destes. Podemos distinguir dois grandes grupos conforme a alteração seja qualitativa ou quantitativa, assim, as alterações podem ser estruturais quando afetam a estrutura de um ou mais cromossomas e podem ser alterações numéricas quando afetam o número de cromossomas. 


Figura 3. Classificação das mutações.

Mutações Gênicas:



  • Mutação silenciosa - mudança de um códon por outro originando o mesmo aminoácido (Figura 4 A).
  • Mutação de sentido trocado - mudança de um códon por outro originando aminoácido diferente (Figura 4 B).
  • Mutação sem sentido - substituição de um códon para aminoácido qualquer por um stop códon (Figura 4 C).
  • Mutação de quadro de leitura - adição ou retirada de uma ou duas bases de um quadro aberto de leitura, redundando na perda de sentido de toda a sequência a partir da alteração.


Figura 4. Mutações Gênicas.

Mutações (aberrações) cromossômicas


Quanto às mutações cromossômicas, elas podem ocasionar a perda de um gene, leitura duplicada ou erros na leitura de um ou mais genes, sendo classificadas como estruturais e numéricas. As mutações cromossômicas estruturais são alterações que afetam a estrutura de um ou mais cromossomas, podendo ocorrer de várias formas. São elas: 

  •  Deleção - Quando se perde uma parte do material genético (Figura 5 A).
  • Duplicação - Quando há repetição de um segmento originando uma leitura dupla de genes (Figura 5 B).
  •  Translocação - Quando há transferência de porções de genes. A translocação pode ser simples ou recíproca. Na translocação simples há transferência de uma porção de genes para um cromossomo não homólogo. Na translocação recíproca (a mais comum) há trocas entre dois cromossomos não homólogos (Figura 5 C).n  Inversão - Quando um segmento sofre um quebra e regressa invertido a sua posição original (Figura 5 D).

Figura 5. Mutações Cromossômicas Estruturais


            As mutações cromossômicas numéricas consistem na alteração do número de cromossomos, quer no excesso, quer no déficit dos mesmos. Podem ser efetuadas durante a meiose, devido à não disjunção dos homólogos na meiose I, ou então quando não ocorre disjunção dos cromatídeos na meiose II. São classificadas como aneuploidias (determinado par de cromossomo. Ex.: trissomia do 21) ou poliploidias (conjunto cromossômico multiplicado. Ex.: triplóides (3n)).
            Existem sítios preferenciais pra ocorrências de mutações, são os chamados Hot Spots; com maior freqüência as mutações são repetições de sequências simples (di-, tri-, tetranucleoídeos).


Reparo

É a capacidade da maquinaria celular de corrigir os erros (danos) que podem levar a mutações. Muitos danos sofridos pelo DNA podem ser reparados porque a informação genética é preservada em ambas as fitas da dupla-hélice, de tal forma que a informação perdida em uma fita pode ser recuperada a partir da fita complementar. Os mecanismos existentes e conhecidos de reparação do DNA lesado são provavelmente universais (com alguma variação entre procariotos e eucariotos) e uma célula pode ter vários sistemas capazes de atuar ao mesmo tempo no DNA lesado.
Diversas enzimas estão envolvidas no mecanismo de reparo, no qual reconhecem uma base alterada, remove contando o filamento do DNA. 
            Cerca de 99,9% dos erros iniciais (introduzidos na replicação) são corrigidos. O reparo do DNA também corrige quebras bifilamentares no DNA e remove nucleotídeos danificados que surgem após a replicação, como fruto de ataques físicos ou químicos à molécula de DNA.

Principais Enzimas envolvidas:
  1. DNA glicosilases: cortam ligações base-açúcar, gerando sítios apurínicos ou apirimídicos.
  2. AP endonuclease: corta a estrutura açúcar-fosfato sem base nitrogenada.
  3. Exonucleases: removem um trecho de unidades açúcar-fosfato.
  4. DNApol: preenche o espaço com nucleotídeos complementares ao outro filamento.
  5. DNA ligase: liga as pontas recém sintetizadas (ligação fosfodiéster 5´-3)

Mecanismos de reparo de lesões: 

  •  Reparo dependente de luz (fotorreparo)
  • Sistema de reparo por excisão
  • Reparo por mau pareamento
  • Reparo por recombinação (pós-replicação)
  • Sistema de reparo livre de erro.


Reparo dependente de luz (fotorreparo)
O DNA é exposto a UV que irá gerar dímeros de pirimidina (T). Um dímero de timina tem um anel ciclo-bitano que liga os anéis nitrogenados originais das duas timinas adjacentes; Esta lesão impede a replicação do DNA.


Uma enzima chamada DNA fotoliase reconhece este tipo de ligação e na presença de luz visível é ativada e cliva a ligação pirimidina – pirimidina, isto é, cliva o anel ciclobutano (Figura 6).


Figura 6. Mecanismo de reparo por Fotorreparação.

Reparo por excisão
São classificas em 2 tipos:

  • Excisão de bases - Bases anormais, modificadas, e dímeros de pirimidinas
  • Excisão de nucleotídeos - DNA danificado por distorção na dupla hélice, incluindo bases anormais, modificas e dímeros de pirimidinas

Este mecanismo envolve 3 etapas: uma exonuclease de reparo do DNA ou complexo enzimático se liga e remove a base ou nucleotídeo danificado, a DNA polimerase é recrutada e preenche o espaço usando o filamento não danificado como molde, e a DNA ligase sela as quebras deixadas.


Reparo por mau pareamento
Erro na replicação, incluindo mau pareamento de base, em que a revisão é feita no terminal 3’ do filamento nascente, o filamento molde é identificado através da metilação na fita parental (Figura 7).





A                                                  B
Figura 7. Reparo por mau pareamento. A. Fita parental metilada. B. Mecanismo de reparo.


Reparo por recombinação

Neste mecanismo, a fita complementar não danificada é utilizada como molde na substituição do fragmento lesado. A DNA  polimerase, então, é forçada a passar pela lesão sem replicar aquela região. Uma lacuna com um tamanho considerável é deixada na fita recém-sintetizada. A informação contida na lacuna só poderá ser recuperada pela utilização de uma outra molécula idêntica de DNA, contida no cromossomo homólogo.
Após uma mutação, a fita 1 do homólogo A (1A) não está disponível; a fita 2 do homólogo A (2A) possui uma lacuna. As fitas 1 e 2 do homólogo A’ (1A’ e 2A’, respectivamente) estão íntegras. No reparo por recombinação, a fita 1A’ é permutada pela fita 2A, de modo que 1A’ sirva de molde para reconstrução de 1A; e 2A’ sirva de molde para 2A.


Em E. coli, é de fundamental importância a proteína RecA, que é
capaz de parear duas moléculas de DNA homólogas e catalisar as reações de
trocas de fitas, permitindo reparação e recuperação de lesões.

Sistema de reparo sujeito a erros (ou SOS)
Quando o erro causado é muito extremo e nenhum outro mecanismos de reparo é capaz de solucionar o dano, a célula utiliza como último recurso o sistema de reparo sujeito a erros (error prone repair), no qual qualquer uma das quatro bases é inserida no local lesado, a fim de garantir a continuidade do processo de replicação. Devido ao fato de não haver a informação precisa (molde), o próprio mecanismo de reparo acaba sendo o causador de uma mutação, pois a chance de introduzir uma base incorreta na cadeia é grande. De qualquer forma, para a célula é preferível incorporar uma base incorreta e permitir que a replicação continue, do que não replicar mais.
Na E. coli a expressão dos genes SOS é induzida por um defeito severo o bastante a ponto de impedir a síntese de DNA (aparentemente fragmentos de DNA gerados pelo bloqueio da síntese normal sinalizam para a ativação). Estes genes dão origem a proteínas de reparo como, por exemplo, endonucleases de excisão e helicases, entre outras.
Os dímeros de pirimidinas constituem um exemplo típico desse tipo de
dano (se não retirados pela fotoliase ou por outro mecanismo qualquer). Quando a forquilha de replicação encontra um dímero, a síntese pára e só é reiniciada a alguma distância além do dímero, ficando uma lacuna no DNA na qual a enzima de recombinação RecA se liga. Essa ligação ativa a RecA: ela destrói o repressor dos genes SOS (repressor LexA). Dessa maneira, a proteína RecA promove reparação do material genético de duas formas: por recombinação, com troca das fitas, e por indução dos genes SOS.


Reparo em bactérias
Como mostra na figura 8, na presença de uma alteração conformacional causada por um erro ou dano na fita de DNA, enzimas são recrutadas e desempenham o papel no mecanismo de reparo em bactérias. A enzima UvrA se dimeriza e e forma um complexo com UvrB, se ligando ao DNA e procurando distorções graças à sua fraca atividade helicase 5’→3’. Ao encontrar uma lesão, UvrA se dissocia e UvrB induz uma desnaturação parcial da região lesada. Uma UvrC é ligada e o complexo UvrB-C faz duas incisões na fita danificada. UvrC promove incisão à 8 nucleotídeos na porção 5’ e UvrB promove outra incisão à 4-5 nucleotídeos na porção 3’. A UvrD (helicase 3’→5’) e a DNA pol I removem o fragmento de 12-13 nucleotídeos danificado. UvrB e C são liberados. A DNA pol I sintetiza a nova fita e a DNA ligase a sela.


 Figura 8. Mecanismo de Raparo em bactérias


Reparo em eucarionte
O DNA danificado é reconhecimento e cerca de 30 nt ao redor do nt danificado é removido, sendo este espaço preenchido de acordo com a complementaridade de bases., o reparo é feito preferencialmente do filamento molde (Figura 9).



Figura 9. Reparo em eucarionte

O mecanismo de reparo em bactérias e eucariontes, são muito semelhando, e as enzimas que participam do processo são homólogas (Figura 10).






Figura 10. Semelhanças no processo de reparo em bactérias e eucariotos.


O Problema da mitocôndria
As mitocôndrias desempenham um papel central no metabolismo de células eucarióticas, contribuindo para a produção de energia, metabolismo intermediário e para os mecanismos de morte celular. Além dessas várias funções, mitocôndrias se destacam de outras organelas celulares por possuírem seu próprio genoma (mtDNA) , distinto do DNA nuclear. Em células de mamíferos o DNA mitocondrial é uma molécula circular, de cerca de 16.500 pares de bases, que codifica para 13 proteínas, 22 tRNAs e 2 rRNAs. Todas as 13 proteínas codificadas pelo mtDNA são componentes de 4 dos 5 complexos do sistema de fosforilação oxidativa. 
Os organismos vivos desenvolveram vários mecanismos de reparo de DNA para combater os efeitos deletérios do acúmulo de lesões em DNA. A maioria dessas vias é conservada evolutivamente, de bactérias até seres humanos, atestando para sua importância na manutenção da vida. Enquanto várias vias moleculares de reparo de DNA já foram caracterizadas no núcleo de células eucarióticas, pouco se sabe sobre os mecanismos atuantes sobre o genoma mitocondrial.
Experimentos realizados com extratos protéicos mitocondriais mostraram que são capazes de catalisar a recombinação de plasmídeos "in vitro”, indicando que o genoma destas organelas estão sujeitos a outros tipos de reparo.
Estudo com plantas e levedura, no qual são clonados genes capazes de complementar bactérias deficientes no reparo por excisão de nucleotídeos demonstra a existência de reparo, devido a presença desses genes.
O conhecimento do reparo de DNA mitocondrial pode ser essencial no estudo de diversas doenças que estão associadas com a mitocôndria, bem como com o processo de envelhecimento.

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